Por que os super-heróis fascinam tantas pessoas? Seria pelo poder sobre-humano e liberdades consequentes, ou pela chance de fazer a diferença para o mundo e respectiva glória. Quando alguém senta na poltrona do cinema para assistir a “Os Vingadores” da Marvel Studios, o que realmente lhe entretém?
O que instiga
mais em um filme são as perguntas que este mesmo leva o espectador a se fazer.
Quando há um herói explícito, como no exemplo dado, a primeira pergunta que vem
em mente, às vezes sem que se perceba, é “o que eu, quem assiste, faria nessas
situações apresentadas se fosse esse super-herói?.” O que você faria se fosse o
“semideus Thor”; ou o “supersoldado ressuscitado Steave Rogers”; ou o “gênio, bilionário,
playboy, filantropo Tony Stark”; ou o
“amaldiçoado Dr. Bruce Banner”?
O universo dos
heróis instiga muito pelos dilemas que advém do confronto entre poder e
responsabilidade. Se você fosse um super-herói, seus problemas atuais não
existiriam. Essas dúvidas e conflitos que lhe são difíceis e, ao mesmo tempo,
lhe fazem sentir-se mundano, irrelevante, ou até mesmo até egoísta, seriam
desprezíveis. Os supervilões que ameaçam o mundo inteiro seriam seu problema
prioritário, pois proteger a humanidade estaria acima de você mesmo. Seus conflitos
pessoais internos e interpessoais teriam uma desculpa perfeita para serem
deixados em segundo plano. Você pode fugir dos seus problemas sem receio de
parecer fraco.
Este é o outro
lado da história dos super-heróis. Os verdadeiros personagens dessa trama dos “Vingadores”
não se confundem com seus “alter-egos”. O personagem do filme não é o “Hulk”, mas
Dr. Bruce Banner. Não é o “Homem-de-ferro”, mas Tony Stark. Não é o “Capitão
América”, mas Steave Rogers. Não é “Thor” o semideus, mas “Thor” primogênito de
uma família tradicional, tendo um irmão caçula desajustado. A história não é
sobre como os “supers” brigam e produzem cenas antológicas de efeitos
especiais, mas sobre como os humanos por trás deles são seres com problemas
mundanos a resolver. O detalhe mais importante é que a própria situação
problemática a ser resolvida pelo filme só existe porque o irmão mais novo do
semideus resolve “aprontar uma travessura”. Para quem não é familiarizado com
histórias em quadrinhos, filmes de super-heróis ou mitologia nórdica, “Loki” é
o próprio Deus nórdico da travessura. Ele é tanto o vilão que fez com que os “Vingadores”
acontecessem, quanto o animado e querido “Maskara”, interpretado por Jim Carrey
em 1994.
http://www.impactonline.co/features/727-avenge-this-tom-hiddleston-and-mark-ruffalo |
A questão que
fica é “você desejaria ser um super-herói?”. Mais especificamente: “sendo lhe
dada essa opção, você escolheria se tornar um?”. Por quê? A depender de sua
resposta, se lhe fosse dada a opção, é bem provável que você se tornasse “super”,
mas algo bem distante de um herói.
“Herói é uma figura arquetípica que reúne em
si os atributos necessários para superar de forma excepcional um determinado
problema de dimensão épica. Do grego ‘hrvV, pelo latim heros, o termo herói
designa originalmente o protagonista de uma obra narrativa ou dramática. Para
os Gregos, o herói situa-se na posição intermédia entre os deuses e os homens,
sendo, em geral filho de um deus e uma mortal, ou vice-versa. Portanto, o herói
tem dimensão semidivina. Variando consoante as épocas, as correntes
estético-literárias, os gêneros e subgêneros, o herói é marcado por uma projeção
ambígua: por um lado, representa a condição humana, na sua complexidade
psicológica, social e ética; por outro, transcende a mesma condição, na medida
em que representa facetas e virtudes que o homem comum não consegue mas
gostaria de atingir – fé, coragem, força de vontade, determinação, paciência,
etc. O heroísmo que resulta em
autossacrifício chama-se martírio.” (http://pt.wikipedia.org/wiki/Her%C3%B3i)
O mártir é o
herói que morre para que o problema seja resolvido. No filme “Os Vingadores” há
um desses, mas que não se deixem “spoilers”.
Só uma dica, ele não é um dos principais. Ser herói significa sofrer, arriscar-se
até o limite de se tornar o mártir. Quanto mais perto do autossacrifício, mais
se é heroico. Então, se superpoderes lhe fazem fugir dos seus próprios
problemas, ao invés de enfrentá-los, tomar decisões, errar bastante antes de
acertar, sofrer as consequências dos erros e até dos acertos, o quanto eles não
lhe distanciariam de fato do heroísmo original?
O “Drama e tragédia” são invenções gregas. Originalmente o primeiro significava
apenas “ação”, num sentido próximo de representação teatral. O segundo seria
uma forma específica desse “Drama” em
que o personagem principal, leia-se “o herói”, lida com um conflito com algo
que está acima de si mesmo, leia-se “o mundo ou a humanidade”. Essas palavras
hoje ganharam muitas conotações diferentes. O interesse de expor estas raízes
etimológicas está em demonstrar como o pensamento de todo o mundo atual,
principalmente no lado ocidental, foi influenciado por esses conceitos.
O sofrimento
do herói é inalienável. Um indivíduo tem a opção de deixá-lo, mas se o fizer
perde a condição sine qua non para
ser “herói”. Em outras palavras, uma pessoa precisa aceitar a paixão, o
sofrimento, para agir com heroísmo. Tudo que se sofre tem origens em “desejos”
que não podem ser atendidos ao menos de imediato. Conforme a postagem antiga
deste blog “O
abismo entre a sede e o copo d’água”, o desejo decorre de um vazio
interior, esse sujeito que demanda aquilo que um, ou “o”, objeto de desejo pode suprir.
Este vazio teria o nome de “necessidade”. A questão do “querer” é sempre a mais
relevante, pois nela encontra-se a faculdade, o poder de escolha, sobre o
objeto de desejo. Ora, se só existir um objeto de desejo possível, como dar nome à esse tipo de necessidade? O termo mais propício seria "paixão", pois não se pode querer outro objeto em seu lugar, ou abdicar dele de vez, sem perder ou a vida, ou a própria noção de quem se é. Neste ponto é que “paixão” e “herói”
caminham juntos. Isto, pelo menos nesta lógica no mínimo pretensiosa, mas
autenticamente oferecida para entreter antes de informar, estando longe de pretender ensinar
alguma coisa. As perguntas são mais importantes que as respostas, como Confúcio
diria.
Quando você
tem uma paixão, você sabe o que quer. No momento em que você nasceu, seus
pulmões estavam colados. A taxa de oxigenação do seu sangue caia a cada segundo
e o que eram nove meses de conforto e relaxamento dentro de uma bolsa de água
morna tornou-se um momento de absoluta agonia. A reação natural para a qual o
seu corpo foi programado por instinto para o instante em que você entra no
desespero da hipoxia é um espasmo severo do seu músculo diafragma. Você então
inspirou o ar agressivamente para os seus dois pacotes de alvéolos grudados.
Entre o sofrimento agonizante do sufocamento e a dor incomensurável de carne descolando
de carne dentro do seu próprio peito, seu instinto lhe fez escolher sentir doer...
E muito!!! O ar, este com que você nunca houvera tido contato até então, este
que lhe fez sentir frio assim que deixou o corpo de sua mãe, passou a ser em
menos de vinte segundos do seu nascimento o seu objeto de desejo imprescindível.
Para este não há alternativas ou abstenções. Você o quer mais que tudo! Eis a
sua primeira e verdadeira paixão.
Será que todos nós não somos, desde que
nascemos, heróis?
Nenhum comentário:
Postar um comentário